Em todo o mundo, os presos têm
suas formas específicas de comunicação. Algumas delas perecem bastante
complexas, tudo isto com o intuito ímpar de evitar que os Policiais as
identifiquem quando interceptadas.
De acordo com estudo realizados
pó especialistas, as tatuagens, por exemplo, carregam, nas prisões,
significados que, às vezes, permanecem ainda por muito tempo, e alguns desenhos
são sempre vistos na pele de presos de diferentes gerações. Outras imagens
parecem surgir do nada, dão a impressão de que são aleatórias ou que não se
relacionam a crime algum. Só quando nos deparamos com longas listas elaboradas
por policiais ou por pesquisadores que se dispõem a adentrar o perigoso mundo
carcerário, é que nos damos conta do quão elaborado é o processo de se tatuar
na prisão.
Num local em que se pretende
controlar cada ação e palavra dita, as marcas visuais aparecem como uma forma
de romper o silêncio. Os presos ouvem suas próprias vozes sem precisar abrir a
boca e ficam se conhecendo a partir daquelas marcas espalhadas por seus corpos.
No Brasil, alguns desenhos foram
inseridos e outros permanecem até hoje. A história da tatuagem no sistema
carcerário Brasileiro começou a ser traçada nos anos 1920, quando o psiquiatra
do extinto Complexo do Carandiru, Moraes Mello, decidiu catalogar os desenhos
que observava nos corpos dos presidiários.
No livro “Estação Carandiru”, de
autoria do médico Dráuzio Varella, publicado em 1999, aparecem também diversas
fotos de presidiários com uma seção focada nas tatuagens. A partir delas é
possível determinar se o criminoso já esteve preso antes, se já foi um foragido
da justiça, quais crimes cometeu, seu grau de periculosidade, sua preferência
sexual, qual sua “especialidade” no mundo do crime e a qual facção pertence.
As máquinas também são
construídas artesanalmente, como ocorre nas prisões de todo o mundo. No Brasil,
é mais comum que as tintas sejam retiradas de canetas esferográficas comuns.
Uma alternativa à máquina é a agulha enrolada em linha.
Recentemente, foi ainda publicada
uma nova cartilha pelo Governo do Estado da Bahia, escrita pelo Tenente da
Polícia Militar Alden José L. da Silva, com atualizações de significados usadas
como referência em todo o país. De acordo com as pesquisas realizadas, cerca de
60% dos presos do sexo masculino tem alguma tatuagem, sendo que 20% deles
afirmam ter feito a tatuagem enquanto cumpria pena.
Todas as fotografias são de um
Banco de dados do FOTOCRIM, algumas muito pequenas e em baixa resolução, porém,
mesmo assim, é possível saber o submundo das Tatuagens utilizadas no Sistema
Carcerário.
Nossa Senhora Aparecida: Tatuada em tamanho pequeno nas costas
indica latrocínio, nome técnico para roubo seguido de morte; se for feita em
tamanho grande e centralizada, pode significar que o indivíduo é estuprador ou
foi violado durante o cárcere. Tatuada nas mãos, braços ou coxas, indica que o
sujeito é homicida. Se o desenho aparece no centro do peito, significa desejo
de proteção, normalmente usado por detentos com penas longas ou matadores de
aluguel. Em algumas regiões, a imagem do Padre Cícero aparece com os mesmos
fins.
Âncora: É a
tatuagem preferida por marinheiros e pescadores. Feita nos braços, antebraços
ou pernas, simboliza um pedido de proteção e esperança.
Cristo: Tatuado
nas costas, também significa proteção; no peito, indica que o presidiário
participou de um latrocínio.
Teia de aranha: Feitas
nas mãos, nos antebraços, cotovelos ou nas pernas, podem fazer referência à
morte de um cúmplice ou lembrança de um comparsa; no peito, identificam
usuários de maconha. Desenhada na testa, revela que o indivíduo é gay ou que
foi estuprado na prisão; na nuca, também indica um preso que é gay, com o
intuito de lembrar ao sujeito que estiver por trás, durante o ato sexual, que
aquele indivíduo pode ser portador do vírus HIV.
Teia e aranha: As teias também podem identificar indivíduos que
agem em grupo. São tatuadas por indivíduos muito perigosos. A aranha é uma
predadora que espera pacientemente por sua presa, a prende e mata. Está
associada, portanto, aos caçadores, a sujeitos que já mataram antes ou estão
dispostos a matar e até a morrer. A quantidade de aranhas ou teias pode indicar
quem tem posição privilegiada dentro de um grupo, como chefe, conselheiro,
contador etc. Se a aranha está em posição ascendente, subindo, pode significar
que o sujeito pretende subir na hierarquia do crime. Caso esteja em posição
descendente, pode mostrar que o sujeito pretende deixar a vida do crime um dia.
Caveira apunhalada:
O desenho é um símbolo das tropas de operações especiais de algumas Polícias
Militares no Brasil, simbolizando ordem e justiça – a caveira significa a
missão e a faca atravessada significa o sigilo. Pode indicar os “pés de pato”,
que são os matadores de ladrões (essa gíria só é usada no meio policial). Se
estiver tatuada em presidiários, no entanto, indica sujeitos que já mataram
policiais militares ou civis. É normalmente tatuada no antebraço, exibida para
intimidar e adquirir respeito entre os criminosos. Sujeitos adquirem essa
tatuagem para mostrar que não têm medo da polícia e estão dispostos a lutar até
morrer.
Caveira: Um signo
clássico da morte, identifica aqueles que já cometeram assassinato. Ela pode aparecer
inserida em outros desenhos, como dentro de um olho ou em cima de um túmulo.
Cruz: Marcam os
indivíduos de alta periculosidade e só podes ser tatuadas por quem já esteve
preso ou foi condenado pela justiça; normalmente feitas nos ombros ou braços.
Tatuada no meio das costas, identifica um indivíduo que não é somente perigoso,
mas que também leva seus atos até as últimas conseqüências.
Cruz do calvário:
Uma cruz com degraus, que representam a subida de Jesus ao calvário. É feita
sempre em tamanho pequeno, até 10cm. Revela um pedido constante de proteção,
para que a pessoa tenha o “corpo fechado”, imune a ataques, feita normalmente
por sujeitos vingativos, que matam seus inimigos.
Cruz com duas velas
acesas na base: Também para marcar o sujeito perigoso, podem indicar que
aquele é praticante de magia ou que crê em forças ocultas.
Cruzes em par: Normalmente
em tamanho pequeno, representam um pedido constante de proteção, uma forma de
livrar-se do mal olhado ou do diabo.
Cruz com caveira:
Tatuada no meio das costas, identifica aquele que é leal a seus colegas de cela
e sabe guardar segredos. Também pode revelar que é um sujeito que mata para não
morrer. Quando a cruz tem seus quatro “braços” iguais ou quando se assemelha à
cruz de ferro, pode indicar que o preso é um skinhead.
Túmulo ou sepultura:
Significa que o indivíduo guarda um grande segredo, que tem “a boca fechada
como um túmulo” e é, portanto, confiável. Pode também ser um pedido para que
tenha o “corpo fechado”. Se o desenho é acompanhado de nomes ou datas pode
indicar o número de mortos.
Símbolo de Oxóssi:
Representa uma proteção contra prisões e emboscadas.
Águia: Símbolo de
liberdade, geralmente é feita quando o sujeito está terminando de cumprir uma
pena longa; aparece no peito, no braço ou nas costas.
Pomba: Signo para
sorte e bons ganhos. Utilizada por ladrões de residências (conhecidos como
“caxangueiros”), diz-se que evitam que o sujeito seja visto ou pressentido.
Folha de maconha:
Usadas por pessoas ligadas ao tráfico de drogas ou pelos viciados.
Saci Pererê: Muito
usada nos anos 80, mas vem caindo em desuso. Indica traficantes de drogas
poderosos, ainda requisitados do lado de dentro das prisões. O sujeito com essa
tatuagem é responsável pela preparação e distribuição das drogas, bem como pelo
“controle de qualidade” das mesmas.
Duende ou Gnomo: Identifica um possível usuário que também é
traficante de drogas. Acredita-se que quem tem essa tatuagem é responsável pelo
refino e empacotamento da droga.
Bruxo ou Mago: Também identifica um usuário ou traficante de
drogas, habilidoso para roubar ônibus ou lojas. Podem ser especialistas em
armas ou até mesmo em explosivos, para abrir cofres e Caixas Eletrônicos.
Mulher nua: Com as genitálias à mostra, revela que o sujeito é
usuário de drogas injetáveis. Em posições mais “recatadas”, pode representar
uma namorada ou esposa.
Índia: Muito comum nos presídios cariocas nas décadas de 80 e 90,
usada por sujeitos ligados ao Tráfico de Drogas. Nas favelas, não se podia
portar um fuzil se não tivesse uma índia tatuada. Identificava os chamados
“soldados do morro”. Hoje em dia, adesivos de índias em carros e motos ainda
podem chamar a atenção para prováveis traficantes nos morros cariocas.
A morte com uma foice: Revela quem são os “justiceiros”. Presos que
pertencem a grupos de extermínio ou que fizeram justiça com as próprias mãos.
Aparecem nas pernas, costas, ombros ou braços.
Serpente: Indicam
sujeitos pouco confiáveis, assaltantes, pessoas traiçoeiras e perigosas.
Sereia: Tatuada nos braços, ombros ou peito, é usada por quem
cometeu estupro ou crimes de abuso sexual.
Serpente e punhal: Feitas à força naqueles que não têm a confiança
do grupo. Identifica traidores, delatores ou informantes de policiais.
Espada ou punhal: Indica que o sujeito é perigoso e destemido ou
que já cometeu homicídio com arma branca.
Revólver ou pistola: Outra forma de identificar os presos por
latrocínio. Normalmente o desenho é feito na perna. Nos braços ou peito indica
assalto a mão armada.
Fuzil: Significa que é esta a arma que o indivíduo usa para
praticar seus crimes, normalmente assaltos maiores.
Demônio: Identifica aqueles que matam por gosto, que devem ser
abordados com cuidado. Pode também indicar que o indivíduo tem um pacto com o
demônio.
Diabo segurando uma
caveira: Geralmente tatuado nas mãos, identifica psicopatas, homicidas que
não sentem remorso.
Chucky: Marca do
assassino violento. Quando o “Brinquedo assassino” está segurando uma arma
branca ou de fogo pode indicar que o preso é um matador de policiais.
Palhaço ou coringa (genérico; como o das ilustrações de cartas, por
exemplo): Geralmente feito nas costas, usado por pessoas que praticam furto
ou pequenos roubos. Na cadeia, quem tem o palhaço tatuado é chamado de
“comédia” ou “sangue bom”, quando assume crimes cometidos por outros. Algumas
variações do desenho do palhaço podem indicar que o sujeito está envolvido com
formação de quadrilha ou participação em morte de policiais. Quando o palhaço
tem sangue escorrendo pela boca ou pelos olhos, faz referência a comparsas
mortos por rivais, no caso de ser pintado com a cor preta, ou pela polícia,
quando é usada a cor vermelha. Quando o palhaço vem acompanhado de caveiras,
refere-se ao número de policiais mortos, uma caveira para cada policial.
Palhaços com um dos olhos na mão são os desenhos usados pelos olheiros ou pelo
gerente da boca.
Coringa (o personagem de Batman): Também feita por indivíduos
ligados à práticas de roubo e morte de policiais. Os sujeitos que portam esta
tatuagem costumam ser perigosos e frios, dados ao confronto. O desenho pode vir
acompanhado de frases como “Carrego o sorriso da morte” ou “Se for para morrer
que morra sorrindo”.
São Jorge: Simboliza um pedido de proteção aos orixás, tatuado por
presos simpatizantes ou praticantes de alguma religião afro-brasileira. Os
presos que têm essa tatuagem acreditam ter o corpo fechado, que não pode ser
atingido.
Anjo Miguel: É um símbolo de proteção e força contra as investidas
dos inimigos. Em caso de traição ou investida, os indivíduos com esta tatuagem
são os responsáveis por matar o inimigo. É uma alusão à função do anjo Miguel,
considerado o anjo mais poderoso, guerreiro e defensor e que transporta as
almas dos falecidos ao céu.
Caravela: Sinal
de liberdade, geralmente tatuada na altura do coração.
Letras, nomes e datas: Recordação de pessoas queridas da família,
das esposas ou até de grandes amizades. Se o preso tatua seu próprio nome é
porque tem medo de ser morto em briga violenta e ter seu rosto desfigurado,
podendo, assim, ser reconhecido pela tatuagem.
Números de artigos do Código Penal Brasileiro: Os mais comuns são
os números 33 (Tráfico de Drogas), 121 (Homicídio), 171 (Estelionato) ou 157
(Assalto).
Pontos entre o indicador e o polegar ou na parte interna do pulso: Seu
significado depende da quantidade e do desenho formado.
UM: Punguista ou
“punga” – Batedor de carteira em ônibus e locais movimentados;
DOIS: Estuprador;
TRÊS: Em forma de
triângulo – Traficante;
QUATRO: Roubo;
CINCO: Furto;
DEZ: Formando uma
cruz - Homicidas e chefes de quadrilhas;
“X” COM BOLAS NAS
EXTREMIDADES: Símbolo de assaltante de bancos e carro-forte (encontrada em
presídios paulistas);
ESTRELA DE CINCO
PONTAS: Seu portador é chefe de quadrilha.
Carpa: A maioria dos que tatuam a carpa tem passagens por tráfico
de drogas e formação de quadrilhas. Se a carpa está em posição ascendente
(subindo), indica status, como o de gerente, posição conquistada por mérito. Se
a carpa está em posição descendente ou com cabeça de dragão, mostra que o
sujeito tem um lugar privilegiado no grupo. As carpas com outros elementos,
yin-yang, fuzil ou escorpião, por exemplo, identificam integrantes do PCC.
Papa-Léguas ou Ligeirinho: tatuagens menos comuns, mas que foram
encontradas em indivíduos que usavam motos para transportar drogas.
Estrelas: As estrelas, normalmente acompanhadas de um cifrão,
identificam os tesoureiros ou mesmo os chefes de grupos criminosos. Estrelas
com várias pontas podem indicar também o número de pessoas que o sujeito já
matou.
Taz: Alguns
sujeitos que o tatuam estão associados a roubos coletivos ou arrastões.
“Vida Loka”: Quem possui
essa inscrição é visto como um sujeito extremamente audacioso, que não mede conseqüências
na hora de praticar o crime.
Tigre: O sujeito que tatua um tigre é um predador altamente
perigoso, implacável com seus inimigos e que provavelmente já matou vários
rivais.
Polvo: Desenho encontrado com relativa freqüência em indivíduos
responsáveis por arrombamentos e roubos e que têm habilidade para se camuflar e
contra-atacar, qualidades cortejadas entre os criminosos.
Fontes: “Estação
Carandiru” (Varella, 1999) | “Tatuagem: desvendando segredos” (Silva, 2012) |
“Tatuagem de cadeia – a marca do criminoso” (Araújo, 2010) | “A influência e o
significado das tatuagens nos presos no interior das penitenciárias” (Paredes,
2003, monografia)